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Oposição democrática angolana “ultrapassada” por radicais, alerta líder da UNITA
O regime angolano prepara nova fraude para as eleições de 2017, acusa o líder da UNITA. No Parlamento português, Isaías Samakuva alertou para o crescente descontentamento popular, que faz a oposição democrática sentir que “pode ser ultrapassada” por movimentos radicais. E deixou um apelo aos parceiros, como Portugal, para que apoiem “agora” o fortalecimento da democracia angolana, evitando a rutura.
“Preocupa-nos imenso constatar que, especialmente, a camada mais jovem por todos os canto do país onde passamos, transmite a mensagem de que angolanos estão cansados e não vão suportar mais uma fraude”, disse Samakuva, depois de ter exposto exaustivamente os mecanismos usados para viciar os resultados eleitorais em Angola.
O líder da UNITA afirmou que a proposta de lei de registo eleitoral, considerada pouco transparente pela oposição mas já aprovada na generalidade com os votos do MPLA, é o “primeiro passo para uma nova fraude em 2017”. “Pode também perigar a estabilidade em Angola”.
Os angolanos, defendeu, toleraram as fraudes anteriores em nome de “manter país social e economicamente estável”, da reforma das instituições, da adoção de uma cultura democrática, de tolerância e governação transparente. Contudo, adianta, hoje “não têm liberdade nem democracia”, faltam-lhes bens essenciais e empregos, enquanto “uma classe de predadores utiliza o Estado para enriquecimento ilícito ou injustificado”, mantendo-se no poder viciando eleições.
Em causa está uma “tentativa subtil de alterar a ordem constitucional” pelo poder, comportamento que esteve na origem de conflitos na Costa do Marfim, Burkina-Faso ou República Democrática do Congo. E uma manobra para “proteger as fraudes financeiras”.
Sobre estas, Samakuva estimou em 130 mil milhões de euros as verbas petrolíferas por contabilizar nos últimos 4 anos: 37 mil milhões do Fundo do Diferencial do Preço do Petróleo e 93 mil milhões de dólares da Reserva Estratégica Financeira Petrolífera para Investimentos em Infraestruturas de Base. A gestão de ambos compete ao presidente, que “nunca apresentou um relatório sequer da utilização” destas verbas, adiantou.
“Perante esta situação, [o regime] tem todo o interesse em manterem-se no poder, pois uma mudança pode permitir desvendar destino” das verbas, disse o líder da UNITA.
Samakuva alertou ainda para o efeito que um agravamento da instabilidade política em Angola poderia ter nalgumas economias, como a portuguesa. No caso desta, envolve 9000 empresas que exportam para Angola, 150 mil cidadãos a viver neste país e centenas de milhares de famílias que beneficiam do comércio bilateral, adiantou.
“Queremos assegurar aos investidores, aos parceiros portugueses em Angola, que é possível cooperar em Angola sob um regime verdadeiramente democrático. A estabilidade é possível porque a alternância é possível. Impedir a alternância através de fraudes fomenta instabilidade e não o contrário”, disse o líder da UNITA.
Questionado por alguns angolanos na audiência, sobre a necessidade de endurecer a forma de luta, Samakuva defendeu a via da oposição democrática. Mas admitiu que o descontentamento atingiu níveis “preocupantes”, e que os partidos “podem ser ultrapassados”, numa altura em que “há movimentos revolucionários a surgir”.
“A revolução está a acontecer todos os dias, com os angolanos a saberem mais dos seus direitos e deveres”, pelo que será mais difícil ao regime sair desta situação como tem saído de situações anteriores.
A iniciativa foi promovida pelos deputados José Ribeiro e Castro (CDS-PP) e João Soares (PS), que foram praticamente os únicos parlamentares a comparecerem no auditório de São Bento. Os intervenientes fizeram questão de sublinhá-lo.
Ribeiro e Castro sublinhou ser necessário “que se falem com todas as forças politicas angolanas”. Para aplauso generalizado, criticou ainda aqueles que há anos “faziam fila atrás Savimbi, e agora que a Unita está empenhada no processo de paz, primam pela ausência e desconhecimento”.