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Notas do Editor: Lourenço entre o velho regime e uma oposição renovada
Na política angolana há um antes e um depois da eleição de João Lourenço.
Para Lourenço, haverá um antes e um depois da eleição de Adalberto da Costa Júnior.
Com Adalberto, a UNITA muda de atitude e até de natureza, em relação a Isaías Samakuva. Será um partido mais incómodo, chamando atenção para a falta de resultados prácticos do discurso anti-corrupção. E para o irrealismo dos pronunciamentos de Lourenço e membros do seu Governo acerca das perspectivas económicas, face ao contínuo aumento das dificuldades para a maioria dos angolanos (desemprego, perda de poder de compra, etc.). Demonstrando esta viragem, Adalberto desdobra-se em entrevistas a meios de comunicação social angolanos e portugueses, desde a sua eleição.
E, porque em África, sobretudo entre as elites, as questões de pele são importantes, não é indiferente um dos dois principais partidos políticos ter à sua cabeça um mulato. O MPLA, que teve o mulato Viriato da Cruz como fundador - e mais tarde afastou o mulato Lúcio Lara da linha directa de sucessão de Agostinho Neto, entregando o poder a um jovem de seu nome José Eduardo dos Santos - nunca deixou de ser um partido chefiado por quimbundos. Com Adalberto, a UNITA deixou de ser um partido chefiado por umbundos. Liberta-se assim do rótulo de "partido tribal" que o MPLA lhe colou durante tantos anos. O que lhe pode valer milhões de votos, sobretudo nas grandes cidades, onde a etnia é mais "deslaçada" entre os migrantes internos.
Uma UNITA mais interventiva, mais mobilizada e mais catalizadora de descontentamento não poderia surgir em pior altura para o MPLA, que já se desfaz em desculpas para justificar o adiamento das eleições autárquicas de 2020.
E será um momento de verdade para João Lourenço - alinhará com a oposição contra os "marimbondos" intocados pela Justiça (quase todos...) - ou defenderá os "bons marimbondos" do seu partido e do seu círculo de relações, assim revelando ser o discurso anti-corrupção pouco mais do que oco?
Em Moçambique, o líder da oposição (RENAMO) Ossufo Momade, debate-se com a fragmentação do seu partido. A insurreição de Mariano Nhongo é, como revelamos no Africa Monitor, a ponta do véu de uma emergente fractura étnica.
Em Cabo Delgado, o sucesso inicial da estratégia contra-insurgência do Governo, com apoio russo, deu lugar a uma nova fase, de menor actividade, e os grupos armados já tiram partido da situação, conforme damos conta.
Para o presidente Filipe Nyusi, avolumam-se os problemas. Com a imagem da FRELIMO junto da opinião pública devastada pelo caso das "dívidas ocultas", também Nyusi viu o seu nome implicado no caso, em julgamento em Nova Iorque. Antevendo a situação, o presidente moveu influências para que o julgamento fosse silenciado no seu país.
Na Guiné-Bissau, como esperado Domingos Simões Pereira não conseguiu a eleição na primeira volta das presidenciais. Pior, viu a votação descer em relação à obtida pelo PAIGC nas legislativas de Março. O seu adversário é provavelmente aquele que mais temia - Umaru Sissoco Embaló. Que, para já, conseguiu os importantes apoios de Nuno Na Bian e de Carlos Gomes Júnior (ex-PAIGC).