Africa Monitor

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Paulo Guilherme

“Dinastia” dos Santos vai ter continuidade?

“Dinastia” dos Santos vai ter continuidade?


José Eduardo dos Santos anunciou que abandona a política em 2018. Mas não deixou quaisquer pistas sobre a forma como será feita a sucessão – nem sequer se quer ser candidato presidencial em 2017. Os analistas dividem-se sobre se o sucessor será alguém da família ou gente “graúda” do MPLA. A “dança” dos nomes vai acelerar.

Para Alex Vines, do instituto de relações internacionais britânico Chatham House, a “sucessão dinástica é bastante improvável”. Santos deverá apontar um sucessor, mas o MPLA pode ser assertivo na afirmação de um candidato de compromisso, afirmou ao Financial Times.


Um dos nomes com força dentro do MPLA, e que tem vindo a ganhar força sobretudo depois da “queda em desgraça” de Manuel Vicente é o de João Lourenço. Atual ministro da Defesa, Lourenço chegou a ser apontado como sucessor em 2006, mas uma expressão de interesse que caiu mal a Santos custou-lhe uma travessia no deserto.

A candidatura de José Eduardo dos Santos à liderança do MPLA foi aprovada pelo Comité Central, na conclusão da reunião de 11 de março. A eleição terá lugar no VII congresso, em agosto, onde ficará definido também quem serão os cabeças de listas às presidenciais de 2017.

Elias Isaac, diretor da Open Society para Angola, defende que, se Santos “concorrer e for eleito em 2017, é óbvio que vai por lá o seu filho (Zenu), é o mais lógico”. “Temos de ver para crer e o timing proposto é ambíguo”, disse ao Financial Times.

Para Soren Kirk Jensen, da Chatham House, há fortes indicações – incluindo a sua idade avançada e recentes posições políticas – de que (Santos) vai transmitir o poder”. “Apesar de algumas incertezas de curto prazo”, o anúncio de Santos “assinala que mudança política a alto nível vai ter lugar em Angola”.

“Pode indicar que Angola está a mudar para o padrão da África Austral, de partidos dominantes do período da libertação que debatem e escolhem os seus presidentes, por oposição ao padrão da África central, onde muitos presidentes procuram sucessões dinásticas, alteram limites aos mandatos e procuram governar indefinidamente”, escreveu Jansen, em reação ao discurso da passada sexta-feira.

Eugénio Costa Almeida sublinha que o tempo entre Agosto de 2016 e as previstas eleições de 2017” é curto “para o MPLA poder apresentar uma figura consensual e aglutinadora que vise conseguir uma vitória eleitoral de modo lhe possa permitir voltar a designar o Presidente”.

“A História política recente do País tem mostrado que as segundas figuras, naturais possíveis e putativos sucessores, pelas mais variadas razões, emergem sempre queimadas”, sublinha.

Rafael Marques defende que Santos "não tem intenção" de sair de facto da vida política e que o anúncio "serve apenas para descomprimir a atual crise económica e social". "Procura ganhar espaço ao fazer este anúncio, para que as pessoas, durante algum tempo, procurem ser menos críticas porque ele até já anunciou que não vai continuar no poder. É uma forma de não prestar contas”.

"Temos eleições em 2017. Esperava-se que, fazendo um anúncio desta natureza, o Presidente apresentasse um plano, se vai sair antes das eleições. Se a intenção é reformar-se, não pode voltar a candidatar-se às presidenciais", disse à Lusa. Marques considera "muito estranho" que faça um anúncio destes "sem avançar com um plano de transição".

"Vai deixar o filho? Vai deixar o [vice-presidente] Manuel Vicente? Vai abrir o MPLA ao processo democrático?"; "Ao atirar para o ar esta hipótese, ele está a criar condições para, mesmo dentro da massa militante do MPLA [Movimento Popular para a Libertação de Angola, no poder], começar a haver empurrões para a sua sucessão. (...). Vai inadvertidamente apressar a sua saída"; "vai criar uma situação de grande pressão".

Quem não parece ter dúvidas sobre a magnitude do momento é Isabel dos Santos, que prestou uma homenagem ao pai através da rede social Instagram: "Um homem excepcional e um grande africano. Em toda sua acção há dignidade e inteligência. Uma verdadeira fonte de inspiração. Para mim: um pai, um guia, uma referência, um professor...".
E, em inglês: "não tenhas medo da grandeza. Alguns nascem grandes, outros atingem a grandeza e outros têm o impulso da grandeza sobre eles" (citação William Shakespeare).