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Acordos "ineficazes" defendidos pela comunidade internacional para a Guiné-Bissau

Acordos "ineficazes" defendidos pela comunidade internacional para a Guiné-Bissau


Por: Emmanuel de Oliveira Cortês

No quadro de uma resolução da crise política na Guiné-Bissau, o mais recente acordo, o de Conacri, prevê um processo consensual para a escolha de um novo governo. No entanto, desde que foi assinado, em Setembro de 2016, não trouxe melhorias ao nível da estabilidade e resolução do impasse político. Segundo Gustavo de Carvalho, investigador para o Instituto de Estudos Estratégicos (ISS) sul-africano, a comunidade internacional, sobretudo parceiros africanos, podem estar a prescrever acordos pouco consequentes.

Para a União Africana (UA), refere Carvalho no recente artigo "Como a UA Pode Evitar Reinventar a Roda na Guiné-Bissau", a "plétora de planos existentes deve ser avaliada, uma vez que é claro que estes estão longe de ser eficazes. Alguns desses planos lêem-se mais como listas de compras do que listas de prioridades". As "avaliações e os planos anteriores fornecem várias lições sobre como (a UA) poderá conseguir aumentar o seu envolvimento", adiantam.

Gustavo Carvalho adianta que "muitos dos planos acabam por prestar pouca atenção ao que é realmente necessário (ao nível técnico e político) para alcançar os resultados pretendidos". "Isto levanta um dos desafios mais críticos para a construção de paz eficaz e sustentável na Guiné-Bissau".

A recente tentativa de estabilizar o país através deste acordo e de um processo de mediação da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) visa a formação de um governo de consenso que leve o país até às próximas eleições (2018). Mas rapidamente as partes - afectas ao presidente José Mário Vaz ou ao ex-primeiro-ministro Domingos Simões Pereira - se desentenderam sobre a interpretação do Acordo.

Num relatório elaborado pelo Secretário-Geral da ONU, António Guterres, sobre o Gabinete Integrado das Nações Unidas para a Guiné-Bissau (UNIOGBIS) circulado em 7 de Fevereiro do presente ano, entre os países membros da CSONU, Guiné-Bissau está muito longe da implementação do chamado “Acordo de Conakry”. O SG da ONU considera mesmo que a formação de um governo em plenitude de suas funções e apoiado pela Assembleia Nacional guineense, e que respeite o respetivo acordo seria algo indispensável para os progressos na reforma do aparelho militar.

Após a reunião de quarta-feira na sede da ONU no Conselho de Segurança, os países membros expressaram: “profunda preocupação com o impasse político na Guiné-Bissau e instaram as partes interessadas nacionais a implementarem o acordo de Conakry sobre a implementação do roteiro da CEDEAO para resolver a crise política”, refere a declaração citada no Briefing Africa Monitor de hoje.

Desde a independência em 1974, nenhum governo eleito na Guiné-Bissau conseguiu cumprir seu mandato até ao fim. Após uma transição de dois anos que se seguiram ao golpe no ano 2012, o país organizou eleições, levando a algum grau de otimismo tanto no seio dos cidadão guineenses, bem como na comunidade internacional. Desde o Congresso de 2014 do PAIGC, em Cacheu, cinco primeiros-ministros diferentes exerceram suas funções, mas a crise institucional continua.

No artigo para o ISS, Carvalho sugere uma série de medidas para evitar um nível de "cinismo no desenvolvimento de novas abordagens".

Para o referido pesquisador é "fundamental que, ao desenvolver planos de ação, atores como a UA não apenas identifiquem o que precisa ser feito, mas também forneçam uma análise crítica sobre se e como isso pode ser feito, incluindo os meios para garantir que as respostas sejam eficazes".

O analista adianta que "os quadros existentes devem ser utilizados, criticados e avançados", acrescentando que "ao colocar essa discussão num contexto burocrático e institucional interno, a UA poderia identificar suas próprias vantagens comparativas e capacidade institucional para ser eficaz".


Carvalho realça que, ao identificar os seus papéis potenciais e atuais na Guiné-Bissau, a UA deve ter a "coragem de reflectir e identificar as suas próprias forças e fraquezas, não apenas a dinâmica no terreno. Como tal, a coragem é necessária para apoiar o desenvolvimento de planos que se leem menos como listas de compras e mais como orientações reais que poderiam realisticamente ajudar o país a superar a fragilidade", conclui.