Africa Monitor

Análise

André Thomashausen: Para a crise portuguesa, uma solução africana

André Thomashausen: Para a crise portuguesa, uma solução africana

A presente crise económico-financeira em Portugal tende a dar lugar a uma “redifinição das estratégias nacionais”, na esteira da qual a  “opção europeia” perderá terreno a favor da “opção CPLP, que na verdade é uma opção africana” , conforme nota, estabelecendo-se assim um maior equilíbrio entre ambas – prevê André Thomashausen, conceituado catedrático da UNISA-University of South Africa.

À componente económico-financeira da crise, André Thomashausen acrescenta, como elemento acelerador de mudanças, uma “crise de confiança no projecto nacional de Portugal”; na sua perspectiva, o desfecho das eleições de 5 de Junho já abriu o poder um “movimento regenerador e de renascença política” – primeiro sinal de mudança.

Alemão de origem, André Thomashausen teve uma longa vivência em Portugal, onde iniciou a sua vida académica. Há cerca de 30 anos radicou-se na África do Sul. A reputação que tem de grande conhecedor e estudioso das realidades portuguesas nas suas imbricações africanas, conferem especial propriedade às suas análises.

Vantagens africanas

André Thomashausen vê em África um “mercado natural” de Portugal – especialmente para o comércio e a indústria, bem como para o fornecimento de mão de obra especializada, localmente escassa – e, por isso, uma “boa solução” para a crise que o país atravessa, incluindo no aspecto da confiança.

Há apreciáveis afinidades mútuas; 46 milhões de africanos têm o português como língua; os Estados respectivos regem-se por leis de extracção portuguesa; estão repartidos por cinco territórios, mas especialmente concentrados em dois grandes países, Angola e Moçambique, inseridos na África Austral, a parte mais promissora do continente.

As perspectivas de crescimento económico de África, em geral, são “francamente boas” (crescimento médio na última década de 5,7%; 7% até 2020); por exemplo, menos de 10% da terra é aproveitada, enquanto no resto do mundo as capacidades de produção agrícola atingiram estados de esgotamento; taxas muito elevadas de retorno dos investimentos.

Além disso, a estabilidade tem vindo a consolidar-se; a recente integração da África do Sul como membro da grande aliança do sul, os BRIC (Brasil, Rússia,Índia e China), que assim passaram a BRICS, introduziu um elemento de estabilidade adicional para a África, com repercussão especial na África do Sul e Austral.

Apresenta-se um vasto campo ao estabelecimento de sinergias e parcerias entre empresas portuguesas e brasileiras em empreendimentos em África – cenário também facilitado pela existência de afinidades mútuas; idem em relação a interesses empresariais portugueses noutras partes do mundo.

Movimento renovador

André Thomashausen rejeita a ideia, propalada, conforme refere, em meios académicos de Lisboa, de que a presente crise não terá solução; ao contrário, sustenta que ela dará azo a um levantamento renovador de energias nacionais, tal como aconteceu em anteriores crises análogas de bancarrota –  1891 e 1925.

Remete a crise de confiança que vislumbra na actual situação como reflexo de quebras de vontade e de uma atitude pessimista, fenómenos que considera poderem ser ultrapassados por uma abertura a novos horizontes. No seu entender, o mundo, além de Portugal não está para além das fronteiras de Espanha, mas para “além do mar”.

Conforme seu pensamento, as recentes s eleições em Portugal puseram fim a um consulado de “socialistas românticos” – adeptos de uma diluição do país na Europa, responsáveis pela má gestão da economia e da bancarrota, mas também pela ausência de um projecto nacional de Portugal, capaz de gerar confiança.

“A crise de Portugal ultrapassa-se através da reintegração de Portugal continental com o universo português, que não tem fronteiras”, sustenta André Thomashausen. E aos que “estranhem a noção dum Portugal menos interligado com a Europa” lembra que o velho continente “continua dividido por fronteiras de língua, de civilização, e, crescentemente, de classes económicas.”

Observa também que os países europeus economicamente mais fortes não só nunca prescindiram dos seus “monopólios industriais”, como, por força de ditames de Bruxelas, conseguiram o desmantelamento das poucas e pequenas indústrias que os países pequenos tinham, incluindo no sector agrícola. As suas economias ficaram assim confinadas ao sector dos serviços.

E conclui: “Em contrapartida, como parceiro preferido do Brasil, de Angola e de Macau, para somente salientar os mais fortes, Portugal poderá reconquistar o que a Europa lhe está a negar: uma expansão dos lugares de emprego no sector industrial e um ultrapassar da dependência das indústrias do turismo e dos subsídios”.